Informação da revista
Vol. 30. Núm. 11.
Páginas 855-861 (Novembro 2011)
Partilhar
Partilhar
Baixar PDF
Mais opções do artigo
Visitas
11097
Vol. 30. Núm. 11.
Páginas 855-861 (Novembro 2011)
Caso clínico
Open Access
Sucesso da terapêutica de ressincronização cardíaca num doente com insuficiência cardíaca e regurgitação mitral secundária a doença isquémica: Importância do septal flash
Visitas
11097
Renata Gomes
Autor para correspondência
renatagomes50@hotmail.com

Autor para correspondência.
, Regina Ribeiras, Pedro Carmo, Sónia Lima, Francisco Belo Morgado, Eduarda Horta, Raquel Gouveia, Aniceto Silva
Serviço de Cardiologia, Hospital de Santa Cruz –CHLO, Carnaxide, Portugal
Este item recebeu

Under a Creative Commons license
Informação do artigo
Resume
Texto Completo
Bibliografia
Baixar PDF
Estatísticas
Figuras (7)
Mostrar maisMostrar menos
Material adicional (2)
Resumo

Descreve-se o caso clínico de um doente de 76 anos, com antecedentes de cardiopatia isquémica e regurgitação mitral grave funcional, que nos últimos 6 meses se encontrava em classe funcional NYHA III/IV, sob terapêutica médica optimizada, na ausência de sintomas isquémicos e com testes de isquémia negativos. Foi considerada a hipótese de cirúrgica de anuloplastia mitral de redução, mas como o doente apresentava no ECG de superfície padrão de bloqueio completo do ramo esquerdo (BCRE), optou-se por terapêutica de ressincronização (CRT), apesar de existir disfunção biventricular grave e hipertensão pulmonar (HTP) moderada a grave, factores considerados predictores de não-resposta a CRT. Na avaliação ecocardiográfica de dessincronia mecânica por strain bidimensional (2DS), Doppler espectral e Doppler tecidular cor sincronizado para a sístolo (TDI/TSI) verificou-se a ausência de dessincronia aurículo-ventricular, a presença de dessincronia interventricular, sendo a análise da dessincronia intraventricular longitudinal ambígua, mas com evidente dessincronia intraventricular radial. Esta última era desde logo evidente na apreciação visual da imagem bidimensional e modo M, podendo ser descrita como movimento septal multifásico, ou septal flash, tendo sido caracterizada e quantificada por 2DS. Na nossa experiência, a presença deste movimento septal que tem como substrato dessincronia intraventricular de predomínio radial, parece ser um marcador de resposta a CRT, pelo que, ponderados os riscos/benefícios da terapêutica cirúrgica mitral sem revascularização associada, versus CRT, optou-se por esta última, tendo sido observado comportamento de resposta clínica e ecocardiográfica compatível com a actual designação de «respondedor», registada ao primeiro mês e mantida no seguimento de dois anos. Neste caso o estudo ecocardiográfico detalhado do sincronismo mecânico, permitiu a escolha da estratégia terapêutica mais adequada e eficaz.

Palavras-chave:
Terapêutica de ressincronização cardíaca
Strain bidimensional
Speckle tracking
Doppler tecidular
Ecocardiografia
Insuficiência cardíaca
Respondedor
Anuloplastia mitral de redução
Abstract

We describe the case of a 76-year-old man with a history of ischemic heart disease and functional mitral regurgitation who over the previous six months had experienced worsening of functional class (NYHA III/IV) under optimal medical therapy, without ischemic symptoms and with negative ischemic tests. Mitral valve annuloplasty was considered. As the patient presented left bundle branch block on the surface ECG, cardiac resynchronization therapy (CRT) was also considered. There was, however, severe biventricular dysfunction and moderate to severe pulmonary hypertension, which are considered predictors of non-response to CRT. On echocardiographic evaluation of mechanical dyssynchrony by two-dimensional strain (2DS), spectral Doppler and color tissue Doppler imaging (TDI)/tissue synchronization imaging (TSI), we observed absence of atrioventricular dyssynchrony and presence of interventricular dyssynchrony, with inconclusive intraventricular longitudinal dyssynchrony, but with marked intraventricular radial dyssynchrony.

The latter, immediately observed on the two-dimensional image, and termed multiphasic septal motion or septal flash, was characterized and quantified with 2DS. In our experience, the presence of such septal motion, for which the substrate is predominantly radial dyssynchrony, is a predictor of CRT response. Weighing the risks and benefits of mitral valve annuloplasty without associated revascularization versus CRT, we opted for the latter. Marked improvement in clinical and echocardiographic parameters was observed, compatible with the current criteria for “responder”. The improvement began one month after implantation and continued throughout two-year follow-up. In this case, detailed echocardiographic study of mechanical synchrony enabled the most appropriate and effective therapeutic strategy to be chosen.

Keywords:
Cardiac resynchronization therapy
Two-dimensional strain
Speckle tracking
Tissue Doppler imaging
Echocardiography
Heart failure
Responder
Mitral valve annuloplasty
Texto Completo
Introdução

A terapêutica de ressincronização em doentes com insuficiência cardíaca (IC), demonstrou melhoria da qualidade de vida e aumento da sobrevida num número significativo de doentes incluídos em ensaios clínicos multicêntricos aleatorizados1–3. Os critérios de inclusão foram posteriormente incorporados nas actuais recomendações4, nomeadamente NYHA ≥ III/IV, QRS ≥ 120ms e Fej ≤ 35%. Múltiplos estudos monocêntricos não aleatorizados, em vários centros espalhados por três continentes, mostraram ainda benefício adicional se evidência de dessincronia mecânica por técnicas de imagem5–7. Descrevemos o caso clínico de um doente com miocardiopatia dilatada isquémica, preenchendo os critérios das recomendações para terapêutica de ressincronização, mas com regurgitação mitral grave funcional, HTP moderada a grave, disfunção ventricular direita associada, que foi submetido a implantação de pacemaker biventricular com cardioversor-desfibrilhador (CRT-D).

Caso Clínico

Doente do sexo masculino, 76anos de idade, com antecedentes de fibrilhação auricular paroxística e enfarte agudo do miocárdio antero-septal em 1996, submetido a cirurgia de revascularização em 1997 (artéria mamária interna esquerda – artéria coronária descendente anterior; veia safena para artéria coronária primeira obtusa marginal; veia safena para artéria coronária descendente posterior). Nos seis meses prévios, por agravamento da IC teve duas hospitalizações, uma das quais em edema pulmonar agudo. Encontrava-se em classe funcional NYHA III/IV, sob terapêutica médica optimizada: doses máximas toleradas de antagonista dos receptores da angiotensina II, β-bloqueante, diurético e estatina. Durante este internamento, o doente manteve-se sem queixas anginosas, com sintomas de baixo débito cardíaco tendo havido necessidade de terapêutica endovenosa com Levosimendan, sem sucesso. Não se observaram disritmias, tendo permanecido com frequências cardíacas estáveis inferiores a 70bpm; à auscultação cardíaca apresentava S3 com sopro sistólico no apex I-II/VI e a auscultação pulmonar revelava fervores crepitantes bibasais compatíveis com estase pulmonar. Havia também ingurgitamento jugular (JVP 30° de 3cm) e edemas maleolares. Analiticamente de salientar Hemoglobina de 13,2g/dL, NT-proBNP de 2.275pg/ml, Ureia de 59mg/dL e Creatinina de 1,4mg/ml, com provas de função hepática normais (TGO e TGP de 27 e 42U/l respectivamente). O electrocardiograma mostrava padrão cicatricial anterolateral e BCRE com QRS de 130ms. O ecocardiograma revelava ventrículo esquerdo (VE) moderadamente dilatado (dimensões do VED:75mm e VES:61mm com volumes VTD de 186ml e VTS de 133ml), compromisso moderado a grave da função sistólica global (FE Simpson BP de 34%) por acinesia do septo interventricular anterior, parede inferior e segmentos apicais, com hipocinésia moderada posterior; a válvula mitral não apresentava alterações morfológicas contudo verificava-se deformação em tenda e estiramento simétrico do aparelho subvalvular (tenting de 9cm2 e altura de tenda de 26mm) condicionando regurgitação mitral grave funcional com área cor/área aurícula esquerda: 45%; Orifício Regurgitante Efectivo (EROA) de 0,4cm2 e volume regurgitante de 43ml; HTP moderada a grave (Pressão Sistólica na artéria Pulmonar estimada- PSAP: 63mmHg) e disfunção sistólica ventricular direita avaliada pela excursão sistólica do plano do anel tricúspide (TAPSE) de 7mm.

Dada a presença de regurgitação mitral grave, ainda que funcional, associada à HTP e disfunção ventricular direita, foi ponderada anuloplastia mitral de redução pelo que foi realizada coronariografia que revelou patência das três pontagens e ausência de progressão de doença da circulação nativa.

Tendo em conta os resultados controversos da anuloplastia mitral de redução na ausência de procedimento de revascularização associado8–12, decidiu-se avaliar e quantificar a dessincronia mecânica, ainda que a presença de disfunção ventricular direita, HTP grave e regurgitação mitral superior a grau 3, sejam considerados marcadores de não-resposta a CRT. Procedeu-se a avaliação sequencial do sincronismo auriculo-ventricular (AV), inter (InterV) e intraventricular (IntraV), utilizando as ferramentas habituais ecocardiográficas e ainda Doppler tecidular e 2DS por speckle tracking. Verificou-se:

Ausência de dessincronia AV com rácio entre o tempo diastólico do fluxo transmitral e o ciclo cardíaco superior a 40% (Figura 1); ausência de regurgitação mitral pré-sistólica;

Figura 1.

Dessincronia auriculo ventricular- racio entre o tempo diastólico e o ciclo cardíaco: 41%.

(0,22MB).

Presença de dessincronia InterV avaliada por Doppler pulsado espectral: diferencial dos tempos de pré-ejecção dos fluxos pulmonar e aórtico superior a 45ms (Figura 2);

Figura 2.

Dessincronia interventricular: diferencial entre os tempos de pré-ejecção dos fluxos pulmonar (129ms) e aórtico (59ms) de 70ms, avaliada por Doppler pulsado espectral.

(0,3MB).

Presença de movimento septal multifásico designado por septal flash (Figura 3A,B e C), visível a olho e quantificado por speckle tracking como dessincronia de predomínio radial, mas também identificada por análise de strain longitudinal nas projecções apicais. Trata-se de contracção septal precoce, no período de contracção isovolumétrica, concomitante com pré estiramento da parede contralateral que apresenta pico de contracção tardia – strain pós sistólico. O diferencial de tempo entre o pico de strain sistólico septal e lateral, cumpria os critérios de dessincronia radial (superior a 130ms) e longitudinal por 2DS (superior a 65ms). A avaliação de dessincronia longitudinal por Doppler Tissular sincronizado para a sístole (TDI/TSI), era ambígua uma vez que a comparação entre os picos de velocidades sistólicas dos segmentos basais contralaterais não mostrava atraso mecânico ainda que a análise do desvio standard dos 12segundos basais e médios das três projecções apicais (Índice de Yu) fosse superior a 32ms (Figura 3D).

Figura 3.

A) Por TDI/TSI: ausência de dessincronia intraventricular longitudinal: diferença Q-pico de velocidade sistólica tissular septal em relação à lateral inferior a 65ms (56ms).

B e C) Contracção septal precoce (SF- curvas sistólicas precoces) e pico de strain lateral (L-PSS) após o encerramento da válvula aórtica- strain pós-sistólico (grupo de curvas tardias) com diferencial em relação ao pico de strain septal superior a 130ms, quando avaliado por strain radial em PEE-T mas também por strain longitudinal em Apical 4C.

Identificação das curvas características de strain radial e longitudinal no contexto de septal flash: contracção septal precoce (SF), pre-strech (ausência de contracção=estiramento) sistólico precoce da parede lateral com pico de strain após o encerramento da válvula aórtica- strain pós sistólico.

D) Índice de Yu: desvio standard dos 12 segmentos basais e médios (Apical 4C; Apical 2C e Apical Longo-Eixo) superior a 32ms.

(0,79MB).

Na nossa experiência e de acordo com resultados recentes publicados 13–15, a presença de septal flash, é um marcador de resposta a CRT com elevada especificidade e sensibilidade. Assim, ponderados os riscos/benefícios de tratamento cirúrgico versus terapêutica de ressincronização, optou-se pela implantação de CRT-D. Quatro dias após a implantação o doente teve alta com recomeço da actividade normal e um mês depois, foi reavaliado clinicamente, referindo levar «vida normal com marcha diária de 5km» (sic) tendo reduzido a dose de furosemido de 120mg/dia para 20mg/dia. Passados dois meses, na reavaliação ecocardiográfica verificou-se a presença de remodelagem reversa com redução superior a 15% dos volumes ventriculares (VTD:186→150ml; VTS:133→98ml) (Figura 4, Vídeos 1A e 1B); marcada redução da área de tenting mitral (9,04→ 6,47cm2) (Figura 5), condicionando regurgitação mitral ligeira (Grau 1). A PSAP diminuiu para 39mmHg, o volume auricular esquerdo reduziu significativamente de 34 para 28cm2, tendo-se verificado uma melhoria da função do ventrículo direito (TAPSE:7→15mm) (Figura 6). Não se observou dessincronia mecânica residual, com evidente ausência de septal flash em apreciação visual e modo M e quantificado por strain radial e longitudinal (Figura 7). Estes dados ecocardiográficos e clínicos mantiveram-se ao longo de dois anos de seguimento clínico e ecocardiográfico.

Figura 4.

Volumes Telessistólicos e Telediastólicos pós CRT-D.

(0,16MB).
Figura 5.

Área de «tenting» pré e pós CRT-D.

(0,4MB).
Figura 6.

Função sistólica direita pré e pós CRT-D.

(0,39MB).
Figura 7.

Imagem de strain pós CRT: desaparecimento do septal flash (curva amarela) e pico de strain da parede lateral «desviado» para a sístole – prévio ao encerramento da válvula aórtica (curva vermelha).

(0,27MB).
Discussão

A ecocardiografia tem vindo cada vez mais a desempenhar um papel importante no estudo dos doentes com os critérios clínicos e electrocardiográficos para terapêutica de ressincronização. Porque em todos os ensaios clínicos de ressincronização permanece uma população «não respondedora» de cerca de 20 a 30%, tem sido admitida a necessidade de melhorar os critérios de selecção, definir a localização ideal de implantação do eléctrodo ventricular esquerdo e optimizar os intervalos AV e VV do ressincronizador, com base na presença de dessincronia mecânica avaliada por técnicas de imagem. Até ao momento não foi identificado nenhum parâmetro isolado de dessincronia mecânica identificador de resposta ou de ausência dela8. No entanto, sabe-se que a ecocardiografia pode identificar e quantificar a presença, extensão e localização da dessincronia mecânica, utilizando variados parâmetros de dessincronia AV, InterV e IntraV. Para a quantificação da dessincronia IntraV deve ser feita a análise não apenas das velocidades mas também da deformabilidade (strain) miocárdica, longitudinal e radial. Foi demonstrado em múltiplos estudos5–7,16, que quanto maior a extensão e grau de dessincronia mecânica, maior a probabilidade de resposta à terapêutica. Mais recentemente um estudo multicêntrico envolvendo três centros europeus, mostrou que a presença de septal flash e sobretudo se associado a dessincronia AV e/ou InterV, foram capazes de identificar os respondedores a CRT, com uma sensibilidade e especificidade próximas de 100%. Mais importante ainda, a ausência de dessincronia mecânica aos três níveis (AV, InterV e IntraV), permitia isolar os não-respondedores também com elevadas sensibilidade e especificidade13.

Os critérios de resposta à terapêutica de ressincronização não têm sido consensualmente uniformizados, admitindo-se em alguns estudos critérios estritamente clínicos (redução de pelo menos uma classe funcional NYHA associado a uma melhoria ≥ 25% no teste dos 6-minutos), noutros exigindo-se critérios de resposta estrutural (remodelagem reversa ventricular esquerda e redução da insuficiência mitral em pelo menos dois graus), e em outros ainda resposta composta clínica e estrutural. A definição de remodelagem reversa ventricular esquerda foi estabelecida como redução dos volumes ventriculares, sobretudo do VTS superior a 15%, e adicionalmente melhoria da regurgitação mitral funcional resultante da normalização da geometria ventricular indutora de redução da área de tenting17–19.

No ensaio CARE-HF, a redução da regurgitação mitral, quantificável por redução do EROA, resultado da melhoria da função ventricular, foi o principal marcador do prognóstico destes doentes19.

Quanto à terapêutica cirúrgica da regurgitação mitral funcional, no contexto de cardiopatia isquémica dilatada, sabe-se que quando associada a cirurgia de revascularização coronária tem mostrado melhorar os sintomas, mas apenas numa fase precoce, não melhorando o status funcional e a sobrevida a longo prazo8–11.

O caso presente centrava-se exactamente na regurgitação mitral funcional no contexto de cardiopatia isquémica, na ausência de isquémia activa. A regurgitação mitral foi assumida como causa determinante das descompensações clínicas, nomeadamente hospitalizações por edema pulmonar agudo. Além do mais é sabido que a mortalidade nestes doentes aumenta proporcionalmente com a gravidade da regurgitação mitral, sendo esse risco independente da gravidade da disfunção ventricular12.

Este doente preenchia os critérios recomendados na guidelines para indicação cirúrgica da insuficiência mitral: classe IIb, nível de evidência C, com um risco cirúrgico calculado pelo euroscore de 32,6%, uma vez que se tratava de um doente previamente revascularizado, actualmente sem evidência de isquémia.

Por outro lado este doente preenchia os critérios das recomendações para CRT, classe I nível de evidência A4. No entanto, associadamente, havia disfunção ventricular direita e HTP significativa, que em alguns estudos clínicos, nomeadamente no publicado por Erneste Diaz20, são identificados como factores predictores de não resposta a CRT. Para além destes predictores, os autores identificaram também a doença coronária, a regurgitação mitral grave e o VED > 75mm, como importantes predictores de insucesso para terapêutica de ressincronização e que o nosso doente também apresentava. Apesar da ausência de estudos multicêntricos que incluam a avaliação de dessincronia mecânica na selecção de doentes para CRT, vários estudos provenientes de centros de referência demonstraram a importância da presença e intensidade de dessincronia mecânica avaliada por ecocardiografia21. Recentemente um estudo realçou a importância do septal flash na quantificação da dessincronia e predicção de resposta a curto e a longo prazo. Sendo o septal flash uma manifestação de dessincronia IntraV, é necessária para a sua quantificação uma metodologia independente de ângulo, portanto sem necessidade de alinhamento da imagem. A nova tecnologia ecocardiográfica de speckle tracking permite a análise e quantificação da deformabilidade miocárdica (strain) radial, impossível de obter adequadamente com TDI/TSI. Permite ainda uma excelente caracterização do padrão de (des) sincronismo ventricular, com a obtenção de curvas típicas de strain13.

Neste doente dá-se relevo à importância da presença de dessincronia mecânica IntraV radial, identificada por eco bidimensional e 2DS, como predictor de (hiper) resposta clínica e ecocardiográfica a CRT. Estudos observacionais têm demonstrado que a presença de dessincronia IntraV é um importante factor determinante de resposta à terapêutica de ressincronização, enquanto que a dessincronia InterV parece ter menos importância. Um estudo publicado por Gorcsan14 revelou que doentes que apresentem dessincronia longitudinal por TDI e dessincronia radial por speckle tracking têm maior probabilidade de virem a ser respondedores. A dessincronia IntraV-radial isolada identificada como septal flash, foi identificada como um predictor de remodeling reverso ventricular esquerdo15.

Na verdade, a predicção de melhor resposta a CRT ocorre quando presentes dessincronias aos três níveis: aurículo ventricular, Inter e IntraV. No nosso caso estava ausente dessincronia AV e a análise de dessincronia IntraV logitudinal revelou-se ambígua dada a ausência de um dos critérios clássicos ou seja, ausência de dessincronia longitudinal septal lateral mas um Índice de Yu positivo. O Índice de Yu é frequentemente falso positivo na cardiopatia isquémica com paredes ou segmentos cicatriciais. No caso apresentado, estava presente dessincronia InterV e IntraV radial identificada por simples observação da imagem bidimensional e caracterizada e quantificada por strain bidimensional.

Em conclusão, a avaliação ecocardiográfica de um doente proposto para terapêutica de ressincronização, sobretudo se controversa, é crucial, deve ser global, morfofuncional devendo ser realçada a importância da escolha da melhor metodologia para a identificação da(s) dessincronia(s) mecânica(s): Doppler pulsado espectral para a análise do sincronismo AV e InterV e 2DS para o sincronismo de predomínio radial, dada a ausência de dependência de ângulo.

Conflito de Interesses

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

Bibliografia
[1]
C. Linde, W.T. Abraham, M.R. Gold, et al.
Randomized trial of cardiac resynchronization in mildly symptomatic heart failure patients and in asymptomatic patients with left ventricular dysfunction and previous heart failure symptoms.
Am J Cardiol, 52 (Dec) (2008), pp. 1834-1843
[2]
A.J. Turley, S.G. Raja, K. Salhiyyah, et al.
Does cardiac resynchronisation therapy improve survival and quality of life in patients with end-stage heart failure?.
Interact Cardiovasc Thorac Surg, 7 (Dec) (2008), pp. 1146-1147
[3]
A.S. Manolis.
Cardiac resynchronization in congestive heart failure: ready for prime time?.
Heart Rhythm, 1 (Sep) (2004), pp. 355-363
[4]
P.E. Vardas, A. Auricchio, J.J.ET-AL> Blanc.
Guidelines for cardiac pacing and cardiac resynchronization therapy: The Task Force for Cardiac Pacing and Cardiac Resynchronization Therapy of the European Society of Cardiology. Developed in collaboration with the European Heart Rhythm Association..
Europace, 9 (2007), pp. 959-998
[5]
F. Wiesbauer, C. Baytaroglu, D. Azar, et al.
Echo Doppler parameters predict response to cardiac resynchronization therapy.
Eur J Clin Invest, 39 (Jan) (2009), pp. 1-10
[6]
B. Gabe, G.B. Bleeker, A. Sjoerd, et al.
Left ventricular resynchronization is mandatory for response to cardiac resynchronization therapy: analysis in patients with echocardiographic evidence of left ventricular dyssynchrony at baseline.
Circulation, 116 (2007), pp. 1440-1448
[7]
S. Winter, H.J. Nesser.
Echocardiographic aspects of multisite pacing in patients undergoing cardiac resynchronization therapy.
Echocardiography, 25 (Oct) (2008), pp. 1056-1064
[8]
E.S. Bishay, P.M. McCarthy, D.M. Osgrove, et al.
Mitral valve surgery in patients with severe left ventricular dysfunction.
Eur J Cardiothorac Surg, 17 (Mar) (2000), pp. 213-221
[9]
A.H. Wu, K. Aaronson, S. Bolling, et al.
Impact of mitral valve annuloplasty on mortality risk in patients with mitral regurgitation and left ventricular systolic dysfunction.
J Am Coll Cardiol, 45 (2005), pp. 381-387
[10]
N.G. Talwalkar, N.R. Earle, et al.
Mitral valve repair in patients with low left ventricular ejection fractions: early and late results.
Chest, 126 (Sep) (2004), pp. 709-715
[11]
A.M. Gillinov, P.N. Wierup, E.H. Blackstone, et al.
Is repair preferable to replacement for ischemic mitral regurgitation?.
J Thorac Cardiovasc Surg, 122 (Dec) (2001), pp. 1125-1141
[12]
F. Grigioni, M. Enriquez- Sarano, K.J. Zehr, et al.
Ischemic mitral regurgitation: long-term outcome and prognostic implications with quantitative Doppler assessment.
Circulation, 103 (Apr 3) (2001), pp. 1759-1764
[13]
C. Parsai, B. Bijnens, G.R. Sutherland, et al.
Toward understanding response to cardiac resynchronization therapy: left ventricular dyssynchrony is only one of multiple mechanisms. Editorial: Jens-Uwe Voigt, Rocking will tell it.
Eur Heart J, 30 (Apr) (2009), pp. 885-886
[14]
J. Gorcsan, M. Tanabe, G. Bleeker, et al.
Combined Longitudinal and Radial Dyssynchrony Predicts Ventricular Response After Resynchronization Therapy.
J Am Coll Cardiol, 50 (2007), pp. 1476-1483
[15]
J. Annemieke, J. Dantzing, F. Brake, et al.
Qualitative observation of left ventricular multiphasic septal motion and septal to lateral apical shuffle predicts left ventricular reverse remodeling after cardiac resynchronization therapy.
Am J Cardiol, 99 (2007), pp. 966-969
[16]
E. Chung, A. Leon, L. Sun, et al.
Results of the Predictors of Response to CRT (PROSPECT) Trial.
Circulation, 117 (2008), pp. 2608-2616
[17]
Q. Zhang, J. Fung, A. Auricchio, et al.
Differential change in left ventricular mass and regional wall thickness after cardiac resynchronization therapy for heart failure.
Eur Heart J, 27 (2006), pp. 1423-1430
[18]
I. Osama, Soliman, A.J. Dominic, et al.
Baseline Predictors of Cardiac Events After Cardiac Resynchronization Therapy in Patients With Heart Failure Secondary to Ischemic or Nonischemic Etiology.
Am J Cardiol, 100 (2007), pp. 464-469
[19]
J.G. Cleland, J.C. Daubert, E. Erdmann, et al.
The effect of cardiac resynchronization on morbidity and mortality in heart failure.
N Engl J Med, 352 (2005), pp. 1594-1597
[20]
E. Díaz-Infante, L. Mont, J. Leal, et al.
Predictors of Lack of Response to Resynchronization Therapy.
Am J Cardiol June, 95 (2005), pp. 1436-1440
[21]
Carrasso S, Rakowski H, Witte KK, et al. Left Ventricular Strain Patterns in Dilated Cardiomyopathy Predict Response to Cardiac Resynchronization Therapy: Timing is not Everything, J Am Soc Echocardiogr 22:242–9.
Copyright © 2010. Sociedade Portuguesa de Cardiologia
Idiomas
Revista Portuguesa de Cardiologia
Opções de artigo
Ferramentas
Material Suplementar
en pt

Are you a health professional able to prescribe or dispense drugs?

Você é um profissional de saúde habilitado a prescrever ou dispensar medicamentos

Ao assinalar que é «Profissional de Saúde», declara conhecer e aceitar que a responsável pelo tratamento dos dados pessoais dos utilizadores da página de internet da Revista Portuguesa de Cardiologia (RPC), é esta entidade, com sede no Campo Grande, n.º 28, 13.º, 1700-093 Lisboa, com os telefones 217 970 685 e 217 817 630, fax 217 931 095 e com o endereço de correio eletrónico revista@spc.pt. Declaro para todos os fins, que assumo inteira responsabilidade pela veracidade e exatidão da afirmação aqui fornecida.